ABD VOL100 NUM2

Publicação oficial da Sociedade Brasileira de Dermatologia www.anaisdedermatologia.org.br Anais Brasileiros de Dermatologia VOLUME 100 Q NÚMERO 2 Q 2025 FI = 2,6 T Vasculopatia livedoide, calcifilaxia e úlcera hipertensiva de Martorell: atualização sobre úlceras isquêmicas por comprometimento da microcirculação dos membros inferiores T Caracterização clínica e epidemiológica de pacientes com tuberculose cutânea assistidos em centro de referência na Amazônia brasileira: série de casos T Risanquizumabe e guselcumabe para psoríase: comparação indireta na prática clínica durante um ano T Alopecia androgenética masculina T Telemedicina (mobile-Health) como alternativa no seguimento de ensaio clínico randomizado para tratamento da leishmaniose cutânea no estado do Amazonas, Brasil Placa verrucosa solitária no queixo: lúpus eritematoso discoide hipertrófico Amorim CV, et al.

03 a 06 de setembro de 2025 PROGRAME-SE E GARANTA SUA VAGA!

PERIODICIDADE BIMESTRAL EDITOR CIENTÍFICO Sílvio Alencar Marques Universidade Estadual Paulista (UNESP) - Botucatu (SP), Brasil EDITORES CIENTÍFICOS ASSOCIADOS Ana Maria Roselino Universidade de São Paulo (USP) - Ribeirão Preto (SP), Brasil Hiram Larangeira de Almeida Jr Universidade Federal de Pelotas e Universidade Católica de Pelotas, Pelotas (RS), Brasil Luciana P Fernandes Abbade Universidade Estadual Paulista (UNESP) - Botucatu (SP), Brasil EQUIPE TÉCNICA Nazareno Nogueira de Souza BIBLIOTECÁRIA Vanessa Zampier An Bras Dermatol.| Rio de Janeiro | v.100 | n.2 | p. 215–406 | Março/Abril 2025 w w w. a n a i s d e d e r m a t o l o g i a . o r g . b r Anais Brasileiros de Dermatologia Publicação Oficial da Sociedade Brasileira de Dermatologia ISSN: 0365-0596 Online ISSN: 1806-4841

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Volume 100. Número 2. Março/Abril 2025 Sumário Educação Médica Continuada Vasculopatia livedoide, calcifi laxia e úlcera hipertensiva de Martorell: atualização sobre úlceras isquêmicas por comprometimento da microcirculação dos membros inferiores..................................................................... 215 Priscila Neri Lacerda, Lucas Campos Garcia, Izabelle Ferreira da Silva Mazeto, Hélio Amante Miot, Luciana Patricia Fernandes Abbade Artigo Original Caracterização clínica e epidemiológica de pacientes com tuberculose cutânea assistidos em centro de referência na Amazônia brasileira: série de casos .................................................................................................. 228 Letícia Rezende da Silva Sobral, Isabela de Nazaré Tavares Cardoso Souza, Maria Fernanda de Almeida Cavalcante Aranha, Ana Beatriz Dias Silva, Maria Amélia Lopes dos Santos, Renata Mie Oyama Okajima, Francisca Regina Oliveira Carneiro, Carla Andrea Avelar Pires Comparação da efi cácia do propionato de clobetasol e do bexaroteno tópicos no tratamento da micose fungoide em estágio inicial................................................................................................................ 237 Aslı Aksu C¸erman, Pinar Ozdemir Cetinkaya, Birgül Özkesici Kurt, Artun Kırker, I˙lknur Altunay Dupilumabe, corticosteroides e sua combinação para o tratamento do penfi goide bolhoso.................................... 243 Guirong Liang, Hua Qian, Chao Sun, Hanmei Zhang, Zhiliang Li, Suo Li, Ke Jing, Chenjing Zhao, Yuan Wang, Ruiyu Xiang, Xiaoguang Li, Suying Feng Poroma écrino versus porocarcinoma écrino: estudo comparativo de características clinicopatológicas .................... 253 Qin-Xiao Wang, Si-Yu Luo, Kai-Yi Zhou, Xiao Shen, Sheng Fang Efi cácia e segurança do risanquizumabe versus metotrexato em pacientes com psoríase em placas moderada a grave: Resultados do IMMbrace, estudo randomizado, duplo-cego, de fase 3 com período de extensão aberto, no Brasil ........ 260 Tania F. Cestari, Cacilda da Silva Souza, Luna Azulay-Abulafi a, Ricardo Romiti, André V.E. Carvalho, Caio César Silva de Castro, Silvio Alencar Marques, João Roberto Antonio, Lincoln Fabrício, Ahmed M. Soliman, Tianshuang Wu, Ranjeeta Sinvhal, Vassilis Stakias, Alexandra P. Song, Jasmina Kalabic, Naomi Martin, Luiza Keiko Matsuka Oyafuso Interferência do posicionamento de níquel, cromo e cobalto nos resultados dos testes de contato.......................... 272 Ida Duarte, Rosana Lazzarini, Mariana Haffner, Julia P. Silva Dermatose bolhosa por IgA linear: 32 anos de experiência .......................................................................... 277 Tugba Atci, Gizem Pehlivan Ulutas, Ecem Gureler Sirkeci, Rıfkiye Küçükoğlu Análise longitudinal da morbidade hospitalar e mortalidade por câncer de pele no período de 2012 e 2022: comparação com fatores demográfi cos e geográfi cos nos estados brasileiros .................................................... 283 Lucía Alejandra Bolis Castro, Maria Cecília Aires Martins, Kelser de Souza Kock Risanquizumabe e guselcumabe para psoríase: comparação indireta na prática clínica durante um ano.................... 293 Leyla Baykal Selçuk, Hande Ermiş Akkuş, Burak Akşan, Deniz Aksu Arıca Revisão Citocinas, quimiocinas e fatores de crescimento envolvidos na patogênese dos queloides .................................... 300 Mengguo Liu

Alopecia androgenética masculina ....................................................................................................... 308 Gabriel Lazzeri Cortez, Karime Hassun, Luciana Ribeiro Patricio Linhares, Verena Florenço, Maria Valeria Bussamara Pinheiro, Mauricio Mendonça do Nascimento O impacto do expossoma na saúde capilar: manejo não farmacológico. Parte II................................................. 322 Stephano Cedirian, Ludmila Prudkin, Juan Antonio Santana, Jaime Piquero-Casals, David Saceda-Corralo, Bianca Maria Piraccini Artigo Especial II Consenso da Sociedade Brasileira de Dermatologia para tratamento da alopecia areata .................................... 328 Paulo Müller Ramos, Alessandra Anzai, Bruna Duque-Estrada, Daniel Fernandes Melo, Flavia Sternberg, Leopoldo Duailibe Nogueira Santo, Lorena Dourado Alves, Fabiane Mulinari-Brenner Cartas - Investigação Características associadas a reconstruções únicas ou combinadas: análise de 1.124 cirurgias de Mohs ...................... 342 Felipe Bochnia Cerci, Letícia Mari Tashima, Stephanie Matthews, Stanislav N. Tolkachjov Representatividade de imagens com pele negra em livros-texto de Pediatria.................................................... 346 Maria Eduarda Duarte de Oliveira, Ronald Godinho de Oliveira Silva, Melissa Moreira Mansur Clemente, Sabrine Teixeira Ferraz Grunewald Carcinoma sebáceo: perfi l clínico e demográfi co de pacientes de um hospital universitário do Brasil ....................... 349 Tatiana Mina Yendo, Flavia Mascarenhas Damiani, Suzana Matayoshi, Marcello Menta Simonsen Nico Telemedicina (mobile-Health) como alternativa no seguimento de ensaio clínico randomizado para tratamento da leishmaniose cutânea no estado do Amazonas, Brasil............................................................................. 355 Silmara Navarro Pennini, Jorge Augusto de Oliveira Guerra, Paula Frassinetti Bessa Rebello, Marília Rosa Abtibol-Bernardino, Amanda Canto Duarte, Higor Marques de Queiroz, Anette Chrusciak-Talhari, Maria das Graças Vale Barbosa Guerra, Sinésio Talhari Cartas - Caso clínico Caso extremamente prolongado de reação medicamentosa com eosinofi lia e sintomas sistêmicos (síndrome DRESS) secundária a antibiótico à base de penicilina .......................................................................................... 358 Florence Robinson, Lucy Webber, Emma Ormerod, Daniel Keith Schwannoma com apresentação atípica mimetizando carcinoma espinocelular ................................................. 360 Pedro Rolo de Matos, Miguel Silva, Gilberto Rosa, Pedro Canão, Filomena Azevedo Pênfi go vegetante facial simulando carcinoma espinocelular: quando a dermatoscopia confunde o diagnóstico........... 362 Nelson Lobos, Francisca Reculé, Macarena Stevenson, Valentina Darlic, Dan Hartmann, Alex Castro Glomangiossarcoma resultante de lesão traumática no cotovelo ................................................................... 365 Nelson Lobos, María José Pereira, Macarena Stevenson, Dan Hartmann, Valentina Darlic, Alex Castro Pioderma gangrenoso multifocal mimetizando leishmaniose cutânea disseminada – Desafi o diagnóstico .................... 367 Ana Flávia Mundim Ramos, Cristiane Botelho Miranda Cárcano, Davi Carvalho Brito, Daniele Moraes Losada, Cristina Alessi da Rocha, Bruno Augusto Alvares Prurigo pigmentoso relacionado a tendência alimentar popular: a dieta cetogênica............................................ 370 Cristina Barrabés Torrella, Ana Iglesias Plaza, María Teresa Fernández Figueras, Montse Salleras Redonnet Pacientes submetidos a transplante de células-tronco hematopoiéticas devem passar por triagem e monitoramento para câncer de pele? ....................................................................................................................... 372 Miguel Mansilla-Polo Placa verrucosa solitária no queixo: lúpus eritematoso discoide hipertrófi co .................................................... 374 Carolina Viza Amorim, Maria de Lourdes Bialon Santana, Maria Leticia Cintra, Fernanda Teixeira

Fibromixoma acral superfi cial com envolvimento ósseo: descrição e seguimento pós-operatório............................. 377 Ana Carolina Baião Silva, Helena Maciel Guerra, Leonardo Ávila Ferreira, Rafael Fantelli Stelini, Laura Bertanha, Renata Ferreira Magalhães Primeiro caso de pênfi go paraneoplásico positivo para autoanticorpos IgG contra integrina α6............................... 380 Ying Li, Yunmei Dong, Xin Zeng, Wei Li, Yu Zhou, Xiaoguang Li Úlceras vulvares secundárias a angiossarcoma aórtico em paciente com diagnóstico incorreto de câncer de origem primária desconhecida ..................................................................................................................... 384 Denis Miyashiro, Regina Barros Domingues, Malu Viter da Rosa Barbosa, Claudia Giuli Santi, Marcello Menta Simonsen Nico, José Antonio Sanches Cartas - Dermatopatologia Imuno-histoquímica para colágeno IV em doenças bolhosas autoimunes: defi nindo a localização das bolhas subepidérmicas ........................................................................................................................................ 388 Lula María Nieto-Benito, Verónica Parra-Blanco, Ricardo María Suárez-Fernández Cartas - Tropical/Infectoparasitária Meta-hemoglobinemia induzida pela dapsona em criança com hanseníase ....................................................... 391 John Verrinder Veasey, Bruna Cavaleiro de Macedo Souza, Guilherme Camargo Julio Valinoto Cartas - Terapia Primeiro caso de hiperpigmentação em vitiligo após uso de metimazol em paciente com doença de Graves............... 395 Nicolau Lima, Meyer Knobel, Mayara Chinelatto, Maria Victória Quaresma Tratamento bem-sucedido com omalizumabe na urticária de pressão tardia, confi rmado por teste de provocação ....... 399 Cesare Ariasi, Gabriele Perazzolli, Luca Rubelli, Alessandro Fraghì, Piergiacomo Calzavara-Pinton Tratamento bem-sucedido de celulite eosinofílica com curso rápido de dupilumabe ........................................... 401 Hiram Larangeira de Almeida Junior, Ana Letícia Boff Metástases cutâneas zosteriformes de carcinoma de mama HER2 positivo com boa resposta a tratamento com lapatinibe...... 403 Marcela Hernández-Coronado, Iván Alejandro Rivera-Alonso, Adrian Cuellar-Barboza, Jorge Ocampo-Candiani

Anais Brasileiros de Dermatologia 2025;100(2):215--227 Anais Brasileiros de Dermatologia www.anaisdedermatologia.org.br EDUCAC¸ÃO MÉDICA CONTINUADA Vasculopatia livedoide, calcifilaxia e úlcera hipertensiva de Martorell: atualiza¸cão sobre úlceras isquêmicas por comprometimento da microcircula¸cão dos membros inferiores , Priscila Neri Lacerda a, Lucas Campos Garcia b, Izabelle Ferreira da Silva Mazeto c, Hélio Amante Miot c e Luciana Patricia Fernandes Abbade c,∗ a Santa Casa de Misericórdia da Bahia, Hospital Santa Izabel, Salvador, BA, Brasil b Hospital das Clínicas, Faculdade de Medicina, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, MG, Brasil c Departamento de Infectologia, Dermatologia, Diagnóstico por Imagem e Radioterapia, Faculdade Medicina, Universidade Estadual Paulista, Botucatu, SP, Brasil Recebido em 11 de julho de 2024; aceito em 26 de setembro de 2024 PALAVRAS-CHAVE Arteriolopatia urêmica calcificante; Calcifilaxia; Hipertensão; Vasculopatia livedoide Resumo Úlceras isquêmicas por comprometimento da microcircula¸cão dos membros inferiores são causas de úlceras dolorosas que oferecem desafio para o diagnóstico correto e tratamento. Vasculopatia livedoide, calcifilaxia e úlcera hipertensiva de Martorell fazem parte desse grupo e apresentam algumas semelhan¸cas entre si em virtude do comprometimento oclusivo microvascular. São frequentemente diagnosticadas erroneamente como úlceras inflamatórias, do tipo pioderma gangrenoso, e vasculites. Nesta revisão são discutidos fisiopatogenia, fatores de risco, aspectos clínicos, diagnósticos diferenciais, histopatologia e apresentada uma atualiza¸cão terapêutica da vasculopatia livedoide, calcifilaxia e úlcera de Martorell. Embora sejam causas menos frequentes de úlceras crônicas, o diagnóstico correto é fundamental para diminuir a chance de terapêuticas equivocadas que podem impactar na morbimortalidade relacionadas a essas condi¸cões. © 2024 Sociedade Brasileira de Dermatologia. Publicado por Elsevier Espan˜a, S.L.U. Este e´ um artigo Open Access sob uma licen¸ca CC BY (http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/). DOI referente ao artigo: https://doi.org/10.1016/j.abd.2024.09.004 Como citar este artigo: Lacerda PN, Garcia LC, Mazeto IFS, Miot HA, Abbade LPF. Livedoid vasculopathy, calciphylaxis, and hypertensive ischemic ulcer: update on ischemic ulcers due to impaired microcirculation of the lower limbs. An Bras Dermatol. 2025;100:215--27. Trabalho realizado no Departamento de Infectologia, Dermatologia, Diagnóstico por Imagem e Radioterapia, Faculdade Medicina, Universidade Estadual Paulista, Botucatu, SP, Brasil. ∗ Autor para correspondência. E-mail: fernandes.abbade@unesp.br (L.P. Abbade). 2666-2752/© 2024 Sociedade Brasileira de Dermatologia. Publicado por Elsevier Espan˜a, S.L.U. Este e´ um artigo Open Access sob uma licen¸ca CC BY (http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/).

P.N. Lacerda, L.C. Garcia, I.F. Mazeto et al. Introdu¸cão As úlceras crônicas de membros inferiores são condi¸cões comuns entre adultos, com inúmeras causas, e muitas vezes representam desafio diagnóstico e terapêutico. As principais causas das úlceras crônicas de membros inferiores são doen¸cas venosas, arteriais e neuropáticas.1 As úlceras isquêmicas, como as de origem arterial, desenvolvem-se em decorrência de suprimento sanguíneo inadequado por comprometimento da macrocircula¸cão arterial. Sua causa mais comum é a doen¸ca aterosclerótica.2 Entretanto, neste artigo, abordaremos as outras causas de úlceras isquêmicas dos membros inferiores, relacionadas ao comprometimento oclusivo da microcircula¸cão; são elas: vasculopatia livedoide, calcifilaxia e úlcera isquêmica hipertensiva. Embora sejam causas menos comuns de úlceras crônicas de membros inferiores, elas devem ser reconhecidas clinicamente e fazer parte dos diagnósticos diferenciais, pois geralmente são confundidas com outras causas, o que ocasiona atraso no diagnóstico e no tratamento.3 Vasculopatia livedoide Defini¸cão A vasculopatia livedoide (VL) é doen¸ca ulcerativa crônica com curso clínico marcado por períodos de remissões e exacerba¸cões. A VL acomete a região distal das pernas, os tornozelos e o dorso dos pés (fig. 1).4 O quadro é intensamente doloroso e provoca significante redu¸cão da qualidade de vida.5 A VL é doen¸ca trombótica distinta da vasculite, pois não é caracterizada primariamente por danos na parede dos vasos ou infiltrado inflamatório. Alguns autores não a consideram entidade única, mas a manifesta¸cão cutânea de diversas doen¸cas que cursam com hipercoagulabilidade, trombose dos vasos da derme e redu¸cão da fibrinólise, como doen¸cas autoimunes, síndromes neoplásicas, anomalias congênitas ou adquiridas do sistema fibrinolítico, dentre outras.6,7 Epidemiologia e fatores de risco A VL é considerada doen¸ca rara com incidência estimada em 1:100.000 por ano. Predomina nas mulheres, em razão de 3:1. As lesões podem se agravar nos meses mais quentes doano.7 A faixa etária mais acometida é dos 15 aos 50 anos, com idade média de 32 anos.5 Muta¸cões hereditárias e adquiridas que predispõem à hipercoagubilidade já foram identificadas. Os genes mais frequentemente envolvidos são o MTHFR (methylenetetrahydrofolate reductase), PAI-1 (plasminogen activator inhibitor-1), gene da protrombina e do fator V.8 Uma revisão sistemática encontrou a muta¸cão PAI-1 - 675 4G/5G como a mais frequente (85,26%), enquanto a PAI-1 A844G, MTHFR C677TeMTHFRA1298C se seguiram em ordem de prevalência, respectivamente. Nos pacientes da Europa, América do Norte e América do Sul, as muta¸cões G20210A no gene da protrombina e G1691A no gene do fator V também foram encontradas em parcelas significantes dos pacientes.8 Figura 1 Vasculopatia livedoide. (A) Lesões ativas caracterizadas por pequenas úlceras com crostas e borda eritemato- -purpúricas localizadas na face medial das pernas e pés. Nota-se também livedo racemoso no dorso dos pés. (B) Lesões em remissão na face lateral da perna e pé com cicatrizes acastanhadas e estelares branco-marfínicas caracterizando a atrofia branca de Millian. Condi¸cões protrombóticas sistêmicas são consideradas os principais fatores de risco, como a síndrome do anticorpo antifosfolípide (SAAF), as colagenoses (lúpus sistêmicos, artrite reumatoide, síndrome de Sjögren, doen¸ca mista do tecido conjuntivo) e a anemia falciforme.9 As comorbidades estatisticamente mais associadas são diabetes, hipertensão arterial sistêmica e doen¸ca venosa periférica.10 Na tabela 1 estão destacadas as principais comorbidades associadas à VL. Fisiopatologia Embora o processo fisiopatológico ainda não esteja totalmente elucidado, a trombose não inflamatória dos vasos da derme parece ser um evento chave. Redu¸cão da velocidade do fluxo sanguíneo, dano endotelial e altera¸cões dos fatores de coagula¸cão favorecem a hipercoagulabilidade e atuam de maneira sinérgica para o surgimento da doen¸ca. O processo trombótico pode se estender para o vasa nervorume ocasionar neuropatia.7 A nível molecular, o aumento de fatores 216

Anais Brasileiros de Dermatologia 2025;100(2):215--227 Tabela 1 Comorbidades associadas à vasculopatia livedoide Comorbidades Metabólicas Diabetes mellitus, hipertrigliceridemia familiar, hipertireoidismo, obesidade, hiper-homocisteinemia Cardiocirculatórias Hipertensão arterial sistêmica, insuficiência venosa periférica, doen¸ca arterial coronariana Reumatológicas Artrite reumatoide, lúpus eritematoso sistêmico, síndrome do anticorpo antifosfolípide, doen¸ca mista do tecido conjuntivo Hematológicas Linfomas sistêmicos, gamopatias monoclonais, policitemia vera, trombofilias adquiridas (crioglobiulinas, crioaglutininas, criofibrinogênio), trombofilias congênitas (associadas a muta¸cões nos fatores V, VIII, IX, gene da protrombina, proteínas C e S, antitrombina III, inibidor do fator do plasminogênio e do gene da metilenotetra-hidrofolato redutase [MTHFR]) Infecciosas HIV, hepatites B e C Miscelânea Câncer de mama, asma, migrânea, transplante renal, esclerodermia protrombóticos, como fatores VIII, IX, anticorpos antifosfolípides, homocisteína e lipoproteína (a) são as altera¸cões mais frequentemente relatados.6,10,11 Criado et al., em estudo com 75 pacientes brasileiros com VL, encontraram que cerca de 66% dos casos apresentavam fatores trombofílicos, em que a lipoproteína(a) foi o fator mais comum detectado.10 As lesões cutâneas ocorrem por deposi¸cão pericapilar de fibrina e forma¸cão de trombos que atuam como barreira à difusão de oxigênio aos tecidos, causando isquemia e baixa perfusão tecidual, que prejudica a cicatriza¸cão. Além disso, a hipóxia torna o local afetado uma barreira ineficaz às bactérias, aumentando o risco de infec¸cão.12 Manifesta¸cões clínicas A manifesta¸cão clássica inclui pequenas úlceras profundas, necróticas e dolorosas que atingem a região distal das pernas, especialmente a região maleolar e o dorso do pé (fig. 1A). As úlceras cicatrizam lentamente e deixam cicatrizes características branco-marfínicas atróficas conhecidas como atrofia branca de Millian (fig. 1B). Nesses pacientes, o livedo racemoso pode estar presente, completando uma tríade clássica (fig. 1A).6,7 O livedo reticular também pode ser encontrado, tanto nos membros inferiores quanto, mais raramente, em outras partes do corpo, como mãos, quadril e abdome.4 As úlceras podem ser precedidas por máculas e pápulas purpúricas. Nesse estágio precoce, a dor pode já ser evidente, caracteristicamente intensa e debilitante.4 Oquadro álgico pode ser agravado pela presen¸ca da neuropatia (em mais de 10% dos pacientes), que deve ser ativamente investigada, particularmente nos casos de dor refratária. O padrão de mononeurite múltipla é o mais prevalente à eletroneuromiografia, determinando sensa¸cões dolorosas assimétricas e que não se restringem às áreas ulceradas.13 Embora ocorra com menor frequência, prurido também pode estar presente.4 Na história natural da VL, as lesões recidivam e remitem sem gatilho claro, e é comum que o paciente apresente múltiplas lesões em diferentes estágios de cicatriza¸cão.14 Como comentado anteriormente, a VL pode estar associada a estados de hipercoagulabilidade, doen¸cas autoimunes e estase venosa; entretanto, mais da metade dos casos ocorre em indivíduos sem comorbidades.14 É recomendado que, além do exame físico completo, seja solicitada avalia¸cão laboratorial para investiga¸cão de possíveis causas sistêmicas associadas -- trombofilias, anticorpos antifosfolípides, presen¸ca de paraproteínas, rastreio para colagenoses e avalia¸cão das fun¸cões hepática e renal (tabela 1).15 Há proposta recente de classifica¸cão da VL de acordo com altera¸cões clínicas e laboratoriais presentes: 1) idiopática, sem altera¸cões clínicas e laboratoriais subjacentes; 2) associada a estados de hipercoagulabilidade; 3) associada a doen¸ca reumatológica; 4) com doen¸ca venosa concomitante; 5) associada a outros mecanismos ou mecanismos multifatoriais.14 Histopatologia O exame histopatológico é útil para confirma¸cão diagnóstica. Em alguns casos, mais de uma biopsia pode ser necessária.10,15 Os achados clássicos são trombos nos vasos da derme e infiltrado inflamatório linfocítico perivascular esparso. Deposi¸cão de material fibrinoide nas paredes dos vasos e na derme também pode ser encontrada (fig. 2).15 A presen¸ca de infiltrado neutrofílico não é usual, mas pode estar presente nas biopsias realizadas em áreas ulceradas antigas.10 A identifica¸cão de leucocitoclasia aponta para diagnósticos diferenciais que cursam com vasculite.15 A imunofluorescência direta é positiva na maioria dos casos.10,16 A deposi¸cão ocorre majoritariamente nos vasos sanguíneos, mas também pode ser visualizada na jun¸cão dermoepidérmica. O depósito de IgM e C3 é mais frequente, mas IgG e IgA também podem ocorrer.15 A coleta de material deve ser realizada nas lesões mais recentes, preferencialmente não ulceradas. Diagnóstico diferencial O diagnóstico diferencial inclui doen¸cas inflamatórias e vaso-oclusivas que cursam com ulcera¸cões nos membros inferiores. Dentre as doen¸cas inflamatórias, destaca-se o pioderma gangrenoso e vasculites de médio calibre (poliarterite nodosa - PAN e vasculites associadas ao ANCA).15 Dentre os distúrbios vaso-oclusivos, calcifilaxia, úlcera hipertensiva de Martorell, endocardite, fenômeno de Lúcio, embolia por colesterol, crioglobulinemia e úlceras induzidas por cocaína contaminada por levamizol devem ser descartados.15 Exame anatomopatológico associado às manifesta¸cões clínicas e investiga¸cão laboratorial complementar são necessários para a defini¸cão diagnóstica. Nos casos em que há neuropatia, o diagnóstico diferencial com PAN deve estar 217

P.N. Lacerda, L.C. Garcia, I.F. Mazeto et al. Figura 2 Histopatologia da vasculopatia livedoide. Prolifera¸cão de vasos na derme superficial e profunda, com espessamento da parede dos vasos. Pequenos focos de necrose e trombos pequenos nos vasos superficiais (Hematoxilina & eosina, 1.000×). bem estabelecido; para tanto, as biopsias devem atingir as por¸cões mais profundas do subcutâneo para representar os vasos de médio calibre.13 Tratamento O tratamento da VL é desafiador e geralmente requer uma combina¸cão de op¸cões terapêuticas com mecanismos de a¸cão distintos e sinérgicos (tabela 2). Segundo revisão sistemática, a maioria dos estudos classifica a resposta terapêutica como parcial (quando há qualquer melhora que não seja completa), remissão (quando há cicatriza¸cão de todas as lesões) e recidiva (quando há novo surto). Segundo essa revisão sistemática, cerca de 44% dos pacientes não apresentam resposta ou não toleraram as primeiras op¸cões terapêuticas.5 O tratamento não medicamentoso envolve medidas direcionadas à estase venosa e cessa¸cão do tabagismo.7 As terapias compressivas devem ser prescritas assim que a doen¸ca arterial periférica seja excluída, pela palpa¸cão dos pulsos periféricos, medida do índice tornozelo-braquial ou exames de imagem, como o Doppler arterial de membros inferiores.15 As comorbidades, como as cardiopatias e o diabetes, devem ter controle otimizado.6,17 Pacientes com hiper-homocisteinemia podem ser tratados com reposi¸cão de ácido fólico e vitaminas B6 e B12.7 Os antiagregantes plaquetários são considerados o primeiro degrau na escalada do tratamento, atuando na preven¸cão da forma¸cão de trombos pela vasodilata¸cão e inibi¸cão da ciclo-oxigenase.5 O ácido acetil salicílico (AAS) deve ser usado na dose de 75 a 325 mg/dia.7 O clopidogrel na dose de 75 mg/dia também é op¸cão viável.18 A pentoxifilina é uma xantina com propriedades antiagregantes plaquetárias e vasodilatadoras, além de aumentar a flexibilidade dos leucócitos e eritrócitos, permitindo melhor fluxo, usada isoladamente ou em combina¸cão com os demais antiagregantes plaquetários. Cardiopatias graves e hipotensão são contraindica¸cões. A dose usual de pentoxifilina é de 400 mg, duas a três vezes ao dia.7 Os efeitos colaterais gastrintestinais podem limitar o uso da pentoxifilina e AAS.10 Os anticoagulantes são os fármacos com melhor resposta em monoterapia, por isso podem ser considerados o tratamento de primeira linha, juntamente com os antiagregantes plaquetários.5,17 Os novos anticoagulantes orais inibidores seletivos do fator de coagula¸cão Xa (apixabana, edoxabana e rivaroxabana) ou da protrombina (dabigatrana) são ótima op¸cão terapêutica. Doses menores do que as usuais podem ser eficazes.19 Essa classe apresenta início rápido de a¸cão e não requer dosagens laboratoriais seriadas.7 O tratamento pode ser contínuo ou intermitente, nos casos menos graves.20 Apesar da praticidade e resolutividade dos novos anticoagulantes orais, a varfarina e as heparinas de baixo peso molecular ainda são op¸cão terapêutica para os pacientes com atividade refratária.6 Esteroides sistêmicos, como prednisolona e danazol, são op¸cão terapêutica adjuvante e podem ser utilizados em associa¸cão com os antiagregantes plaquetários e anticoagulantes. Eles apresentam maior eficácia quando os pacientes têm comorbidades reumatológicas, como artrite reumatoide e lúpus eritematoso sistêmico. Além dos efeitos anti-inflamatórios, os esteroides atuariam acelerando a fibrinólise e inibindo a coagula¸cão.5 O danazol acelera a produ¸cão hepática das proteínas C e S, e é especialmente útil em pacientes com aumento de lipoproteína (a). Em geral, é bem tolerado, mas até 20% dos pacientes podem apresentar algum evento adverso, como acentua¸cão de hiperplasia prostática, irregularidade menstrual, viriliza¸cão de pacientes do sexo feminino e altera¸cões hepáticas, que devem ser monitoradas.5,10 Imunossupressores clássicos e fármacos com a¸cão anti- -inflamatória, como hidroxicloroquina, colchicina, dapsona, doxiciclina, azatioprina, ciclosporina e sulfazalassina, podem ser associados ao tratamento. Usualmente, são prescritos em conjunto com antiagregantes plaquetários e/ou anticoagulantes.5,15 Fármacos vasodilatadores periféricos, como nifedipino e cilostazol, podem melhorar a dor e ajudar a cicatriza¸cão.7 Ainda nessa linha de a¸cão, visando a inibi¸cão da vasoconstri¸cão simpática, recentemente foi relatada a aplica¸cão de toxina botulínica A perilesional com bons resul218

Anais Brasileiros de Dermatologia 2025;100(2):215--227 Tabela 2 Principais tratamentos medicamentosos da vasculopatia livedoide Classe Medicamentos Posologia Principais eventos adversos Antiagregantes plaquetáriosa (primeira linha de tratamento) Ácido acetilsalicílico 75-325 mg/dia Sangramentos (mucosa gástrica), dispepsia, tonturas, urticária, angioedema Clopidogrel 75mg/dia Sangramentos, dispepsia, diarreia Pentoxifilina 400mg, 3 ×/dia Cefaleia, desconforto gastrointestinal, rubor facial, risco em pacientes com arritmias Anticoagulantesa (primeira linha de tratamento) Apixabana 2,5mg, 2 ×/dia Sangramentos, dispneia, náuseas, aumento de transaminases e trombocitose Rivaroxabana 20mg, 1 ×/dia Dabigatrana 150mg, 2 ×/dia Sangramentos, dispepsia, náuseas Varfarina Manter RNI entre 2-3 Sangramentos, febre, náuseas, vômitos Heparinas de baixo peso molecular Enoxaparina 1 mg/kg SC, 1 ou 2 ×/dia Sangramentos, confusão, náuseas, rea¸cões anafilactoides Esteroides sistêmicos (segunda linha de tratamento) Prednisona 0,5 a 1,0 mg/kg/dia Hipertensão, hiperglicemia, infec¸cões, insônia, irritabilidade Danazol 200mg/dia Irregularidade menstrual, viriliza¸cão feminina, piora de hiperplasia prostática, petéquias, hepatotoxicidade Vasodilatadores periféricos (segunda linha de tratamento) Cilostazol 50-100 mg, 2 ×/dia Taquicardia, cefaleia, diarreia, edema periférico Nifedipino 20mg, 3 ×/dia Mialgia, edema periférico, constipa¸cão, dor abdominal Imunossupressores clássicos (terceira linha de tratamento) Ciclosporina 3-5 mg/kg/dia Hipertensão, nefrotoxicidade, infec¸cões oportunistas, citopenias, neoplasias malignas Azatioprina 2-3 mg/kg/dia Gastrintestinais, infec¸cões oportunistas e citopenias Sulfasalazina 2-3 g/dia divididos em3 doses Intolerância gastrintestinal, cefaleia, agranulocitose, hepatotoxicidade Imunomoduladores/ miscelânea (terceira linha de tratamento) Hidroxicloroquina 4-6 mg/kg/dia Retinopatia, náuseas, vômitos, pigmenta¸cão cutânea, tonturas, cefaleia, ototoxicidade e neuropatia periférica Dapsona 50-200 mg/dia Erup¸cão ao fármaco com eosinofilia e sintomas sistêmicos, a síndrome DRESS (do inglês, drug reaction with eosinophilia and systemic symptoms), meta-hemoglobinemia e agranulocitose Colchicina 0,5mg, 2 a 3 ×/dia Diarreia, vômitos, cólicas, cefaleia, astenia Doxiciclina 100-200 mg/dia Dispepsia, pigmenta¸cão dentária, inapetência Imunoglobulina intravenosa (em casos refratários) 2 g/kg divididos em 3 a 5 dias a cada 4 semanas Cefaleia, náuseas, vômitos, fadiga a Antiagregantes plaquetários e anticoagulantes podem ser utilizados associadamente. tados, porém com recidiva das lesões em cerca de três meses.21 Diante do número de op¸cões terapêuticas e da dificuldade de manejo, um grupo de autores tentou racionalizar o manejo inicial combinado por meio da abordagem CHAP (bloqueadores de canais de cálcio, hidroxicloroquina, ácido acetilsalicílico e pentoxifilina), com taxa de resposta total superior a 80% no seguimento de dois anos, mas ressalta- -se o pequeno tamanho amostral desse estudo, com apenas 12 pacientes.22 A imunoglobulina intravenosa (IgIV) é modalidade terapêutica de resgaste reservada aos casos refratários aos tratamentos anteriores.5,7 Embora o mecanismo de a¸cão exato não seja bem compreendido, a inibi¸cão da produ¸cão de anticorpos antifosfolípides, da agrega¸cão plaquetária e da disfun¸cão endotelial poderiam explicar a resposta clínica.5 Uma revisão sistemática encontrou taxa de resposta de 95%, com doses de 1-2,1 g/kg, divididas em dois a três dias consecutivos e repetidas a cada quatro semanas. O intervalo de tratamento foi aumentado e a medica¸cão suspensa, de acordo com a experiência do clínico assistente. O primeiro sinal de resposta clínica foi a melhora da dor, e as ulcera¸cões demoraram um período de dias a semanas para cicatrizar. Recorrência ocorreu em cerca de 1/3 dos pacientes.23 Casos que não respondem a IgIV podem ser tratados com fator ativador de plasminogênio tecidual, mas seu uso requer ambiente hospitalar e estrito controle de complica¸cões hemorrágicas.7 Oxigenoterapia hiperbárica é uma modalidade adjuvante, limitada por disponibilidade e custos, realizada com 219

P.N. Lacerda, L.C. Garcia, I.F. Mazeto et al. base na dissolu¸cão plasmática de oxigênio promovida pela oferta de oxigênio a 100% sob altas pressões (duas a três vezes a pressão atmosférica), promovendo oxigena¸cão de tecidos hipóxicos.5 O uso de imunobiológicos anti-TNF e inibidores da JAK tem sido relatado recentemente para casos refratários, rapidamente progressivos ou com contraindica¸cões ao uso de antiagregantes plaquetários e anticoagulantes. Entretanto, esse uso ainda é incipiente e mais estudos são necessários.15,23--26 Assim, o tratamento de VL ainda é um desafio com várias op¸cões terapêuticas e com taxas de cicatriza¸cão variável. Além disso, a maioria dos tratamentos baseia-se em estudos principalmente tipo relatos de casos e séries de casos, os quais fornecem baixos níveis de evidência.5 Calcifilaxia Introdu¸cão A calcifilaxia, também conhecida como arteriolopatia calcificante urêmica, é vasculopatia rara, cutâneo-sistêmica e potencialmente fatal. Caracteriza-se por intensa deposi¸cão de cálcio em pequenos vasos sanguíneos da derme profunda e tecido subcutâneo, em geral associada ao hiperparatireoidismo secundário com altera¸cão do metabolismo do cálcio e fósforo. Pacientes com doen¸ca renal em estágio terminal (baixa taxa de filtra¸cão glomerular ou terapia renal substitutiva) representam a principal popula¸cão afetada pela doen¸ca (calcifilaxia urêmica). Contudo, a presen¸ca de doen¸ca renal não é requisito absoluto para o diagnóstico, podendo ser observada mesmo na ausência da comorbidade, referida nesses casos como calcifilaxia não urêmica. As úlceras cutâneas intensamente dolorosas e necróticas contribuem com a significante taxa de mortalidade da doen¸ca (60%-80%), ainda que diagnosticada em estágios iniciais.27,28 O termo calcifilaxia surgiu após o professor Hans Selye e seus colaboradores conduzirem, em 1961, experimentos sobre o mecanismo de calcifica¸cão metastática. Eles expuseram ratos a doses muito elevadas de vitaminas D ou hormônio da paratireoide, associado a dieta rica em fósforo ou a administra¸cão intravenosa/intraperitoneal de sais de ferro. Desse modo, foram capazes de demonstrar calcifica¸cão metastática maci¸ca do tecido subcutâneo. Nesse experimento, o desenvolvimento de calcifica¸cão cutânea foi considerado rea¸cão adaptativa ou filática e foi referido como calcifilaxia (calcifica¸cão e filaxia).29,30 Entretanto, nesse modelo experimental não foi demonstrada aterosclerose com calcifica¸cão medial, atualmente considerada a fisiopatologia básica da calcifilaxia. Até os dias atuais, o termo calcifilaxia é utilizado amplamente com base nesse experimento, mas é inadequado para explicar a fisiopatogenia da doen¸ca.30--32 Após esse experimento, foram publicados relatos de casos que descreviam pacientes com insuficiência renal que desenvolveram calcifica¸cões subcutâneas generalizadas. Os autores fizeram correla¸cão desses casos clínicos com o modelo experimental de Selye, diagnosticando esses pacientes com calcifilaxia. Diversos relatos semelhantes foram realizados posteriormente utilizando-se o termo calcifilaxia, o qual ainda hoje é amplamente utilizado.30 Epidemiologia A incidência da calcifilaxia em pacientes com terapia renal substitutiva varia de 0,04% a 4%, com aumento crescente na última década. O intervalo entre o início da diálise e o surgimento da doen¸ca é de aproximadamente 30 meses. Pacientes tratados com diálise peritoneal apresentam maior incidência em rela¸cão aos tratados com hemodiálise. A idade média de diagnóstico varia entre 50-70 anos, e é rara em crian¸cas. Aproximadamente 60%-70% dos pacientes com calcifilaxia são do sexo feminino, e alguns estudos relatam maior incidência em caucasianos.33,35 Fisiopatologia e fatores de risco Embora a patogênese da calcifilaxia envolva múltiplos fatores etiológicos, a complexa cadeia de eventos resulta da inflama¸cão e do estado de hipercoagulabilidade secundário às altera¸cões do metabolismo de cálcio e fósforo, com consequente calcifica¸cão vascular e necrose isquêmica cutânea (fluxograma -- fig. 3). O evento inicial é o estreitamento progressivo dos lúmens da microcircula¸cão cutânea e subcutânea por calcifica¸cão dentro da camada média (conhecida como calcifica¸cão medial), prolifera¸cão de células endoteliais e fibrose abaixo da íntima (conhecida como fibroplasia subintimal). Posteriormente, trombose se desenvolve no lúmen do vaso, promovendo a oclusão vascular e as lesões isquêmicas.35 A calcifica¸cão vascular está associada à falta de inibidores de calcifica¸cão molecular na parede do vaso. Um dos principais controladores desse mecanismo é a vitamina K, a qual ativa um potente inibidor de calcifica¸cão chamado proteína da matriz Gla (MGP), secretada por células musculares lisas vasculares e células endoteliais.36 Portanto, estados que levam à deficiência de vitamina K favorecem a calcifica¸cão vascular. Em pacientes com doen¸ca renal em estágio terminal, a deficiência de vitamina K pode ocorrer por menor ingestão de alimentos ricos na substância e também por utiliza¸cão frequente de anticoagulantes inibidores da vitamina K, como a varfarina.37 Segundo estudo alemão com dados de um grande banco de registro nacional, cerca de 50% dos pacientes com diagnóstico de calcifilaxia e doen¸ca renal estavam em uso de varfarina no momento do diagnóstico.36 Pacientes com calcifilaxia apresentam associadamente alta prevalência de hipercoagulabilidade congênita ou adquirida. Essa condi¸cão favorece a trombose na microcircula¸cão, que é o evento final que ocasiona a oclusão vascular. As altera¸cões mais comuns são presen¸ca do anticorpo anticoagulante lúpico, deficiência de antitrombina e deficiência de proteínas C e S.38 Diversos outros fatores de risco foram identificados, como sexo feminino, etnia caucasiana, diabetes mellitus, obesidade, tempo prolongado de diálise, hipoalbuminemia e altera¸cões do metabolismo do cálcio e fósforo.27,29 Manifesta¸cões clínicas e diagnóstico A calcifilaxia pode ser classificada clinicamente como urêmica quando ocorre em pacientes com doen¸ca renal crônica terminal, ou não urêmica quando ocorre em pacientes com fun¸cão renal normal ou que estejam em estágios 220

Anais Brasileiros de Dermatologia 2025;100(2):215--227 Figura3 Fluxograma da sequência de eventos relacionados à fisiopatologia da calcifilaxia: calcifica¸cão de arteríolas, lesão endotelial e consequente oclusão trombótica desses vasos. Essas altera¸cões causam isquemia e necrose do tecido subcutâneo, com surgimento de úlceras necróticas nos estágios mais avan¸cados. PTH, paratormônio. Figura4 Calcifilaxia. (A) Púrpura retiforme e estágio avan¸cado de úlceras necróticas no clássico formato reticulado nos membros inferiores. (B) Úlcera necrótica em maior destaque (paciente da ref. 39). iniciais de doen¸ca renal crônica com fatores de risco como obesidade mórbida, hipertensão arterial e diabetes mellitus tipo 2 como resultado de síndrome metabólica. A calcifilaxia urêmica é a mais frequente. Entretanto, as manifesta¸cões clínicas são similares independente da associa¸cão com doen¸ca renal crônica terminal.3,34 Calcifilaxia deve ser suspeitada em pacientes com os fatores de risco citados anteriormente e que apresentem inicialmente lesões nodulares ou placas subcutâneas dolorosas, purpúricas/eritematosas, associadas a livedo racemoso, principalmente quando presentes em áreas de maior adiposidade, como tronco e membros inferiores. As lesões iniciais rapidamente progridem para úlceras necróticas intensamente dolorosas, com extensão centrífuga, no clássico formato reticulado (fig. 4). Infec¸cão bacteriana secundária pode estar associada e é uma das principais causas de óbito.27,28,30 Embora as lesões cutâneas sejam os principais sinais clínicos da doen¸ca, outros órgãos, como pulmões, músculos esqueléticos, pâncreas, cérebro, olhos e trato digestivo também podem estar envolvidos.30 A história do paciente deve ser obtida e exame completo deve ser realizado para identificar lesões cutâneas adicionais. Em pacientes que usam varfarina, deve ser realizado diagnóstico diferencial entre calcifilaxia e necrose por varfarina. Outros importantes diagnósticos diferenciais são vascu221

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